CHAMA O ANTÓNIO

Jorge Amado foi um dos grandes da cultura brasileira do século passado. Julgo ser do conhecimento comum, mesmo que algumas pessoas continuem a achar que os assuntos ditos culturais estão reservados às elites pouco pensantes.

Jorge Amado foi um militante convicto do Partido Comunista, tendo escrito magníficas obras repletas desse pensamento. Entre elas, aproveito para destacar Os Subterrâneos da Liberdade, peça essencial para quem desejar compreender o período negro que cobriu o Brasil, durante o longo reinado de Getúlio Vargas.

Tenho sérias dúvidas em ponderar que ele pudesse algum dia apoiar o neoliberalismo ultra capitalista do partido cada vez menos social, e muito pouco democrata, que gere as nossas vidas nos dias que correm.

Imagino que Jorge Amado choraria, ao ver o seu nome arrastado na lama, por um representante máximo da propaganda política de um governo que se aliou a um partido com teor salazarista para formar governo na Região Autónoma dos Açores.

Gosto de pensar que mais lágrimas deitaria o escritor se pudesse olhar o armário de António e analisar a quantidade de casacas já trocadas que se encontram lá dentro.

Como já terão compreendido, escrevo estas linhas em resposta ao folheto propagandístico que, porventura por motivos de sobrevivência, António Bulcão lançou, no passado dia 11 de abril, e no qual perdeu uma quantidade exaustiva de tempo a tentar fingir que sabia mais de Jorge Amado do que o resto do mundo. Talvez seja do hábito de perder mais tempo a ganhar currículo do que a aplicá-lo.

Parafraseando as suas palavras, não perderei tempo a analisar os seus escritos. Falará quem sabe e lerá quem quiser. Limito-me a apontar duas grandes questões que me apraz apontar face ao teor das suas letras.

Em primeiro lugar, António acusa-me de ter apresentado um espírito pouco solidário com Sofia Ribeiro, enquanto mulher e feminista. Gostaria de dissertar longas linhas sobre o termo mansplaining, mas não tenho tempo nem vontade de ensinar a António o que ele acha que já sabe.

No entanto, e como quem não se sente não será filho de boa gente, não posso deixar de referir que não preciso que me venha dar lições de moral sobre o feminismo. Muito menos precisará Sofia Ribeiro que ele venha em seu auxílio, como se a Secretária Regional necessitasse de cavaleiros brancos.

Não coloquei em causa a sua seriedade. Essa interpretação não é minha, mas sim da mente de António. E isso diz mais de António do que de mim.

Sofia é uma mulher decidida e determinada, com objetivos, trabalho e realidades próprias. A sua carreira não dependerá de António Bulcão, nem dos seus escritos.

O erro, caro António, está na atual gestão cultural da Região, que não é, nem nunca foi, o que Sofia terá algum dia desejado dirigir. Maior erro estará ainda nas políticas financeiras do XIII Governo, que se revelam diariamente desastrosas.

Mas disso o seu artigo não falava. Limitou-se a atirar areia para os olhos de quem o lê, como se eu fosse a maquiavélica personagem que deseja fazer de mim.

Sou dirigente do Bloco de Esquerda, sim. É um facto. Também sou Adjunta. Mas também sou uma cidadã que se preocupa com a com a realidade apocalíptica da Cultura nos Açores.

Por isso mesmo, pergunto novamente: onde estão as políticas culturais para a Região? Onde estão os anúncios sobre as candidaturas ao Regime Jurídico de Apoio às Atividades Culturais? Qual a delineação de verbas e investimentos para dinamizar as filarmónicas do arquipélago? Que tipo de valorização será executada no que concerne ao património imóvel classificado?

É com um diário de bordo que vamos resolver as coisas? Estamos em abril, caro António. Não é normal continuarmos com sistemáticos atrasos que vão estrangulando todas as pessoas que querem fazer destas ilhas a sua casa, a sua identidade e o seu património.

Sobre isso, António, nada foi escrito no seu artigo. Nem sobre os investimentos anunciados no estrangeiro. Mas não se preocupe, que o título deste artigo não será uma provocação para uma longa discussão sobre a obra musical do artista português Toy. Se algum dia me apetecer discutir isso, faço-o diretamente com Sofia Ribeiro sem a sua preciosa – e bastante misógina – tentativa de defendê-la.

Alexandra Manes
Dirigente do BE/Açores

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