
A violência doméstica não tem status social, não tem credo, nem etnia. E, também, não tem idade.
Se hoje em dia ainda persiste a tentativa de que à mulher, e unicamente a esta, seja atribuído o papel de cuidadora familiar, imagine-se quando esta não podia garantir a sua independência financeira.
Ao longo dos séculos, o papel da mulher foi sendo sempre relativizado, subestimado e desvalorizado. A ela competia cuidar dos filhos, da casa e de não incomodar o seu marido – que durante anos se comportaram como donos, relevando o objeto que a mulher era – para que este não se enfurecesse.
Não enfurecer o marido, dono e senhor, poderia representar menos uma noite sem violência física. Menos uma semana sem a vergonha das nódoas negras que tantas vezes teimavam em aparecer.
Somente no ano 2000, a violência doméstica foi considerada crime público. Pergunto-me como foi possível que durante tantos anos se tenha aceite esta prática violenta? Este sentimento de posse do homem sobre a mulher? Um sentimento de impunidade que era facilitado pela legislação.
Para mim, as pessoas não são números, no entanto, esta é uma das formas de constatarmos a realidade que, muitas vezes convive connosco na nossa rua, dos casos que chegam às entidades competentes. Em 2019, segundo as estatísticas da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), o número de pessoas idosas vítimas de violência aumentou mais de 20% em 2020 face a 2019.
Nos Açores, e segundo o Gabinete de Apoio à Vítima, os números aumentaram de 12% (32) para 17% (40), entre 2020 e 2021.
Na verdade, nos últimos tempos, não sei se feliz (por haver denúncia) ou infelizmente (por haver razões para denúncia) tem sido frequente notícias na imprensa escrita regional dando conta de detenções e julgamentos por via da prática de violência doméstica, em que nos dão conta de 40 e 50 anos de humilhação, pancadaria e de violação dos seus corpos para gáudio sexual do marido… não podemos ter tabus! É verdade! Quantas mulheres foram violadas incessantemente pelos maridos durante anos e anos?
Hoje em dia, a sociedade exige um envelhecimento cada vez mais tardio. Pede-se um envelhecimento ativo, com conhecimento das novas tecnologias, um investimento e aposta na universidade sénior.
Não podemos permitir que as mulheres vítimas de uma vida inteira de violência doméstica tenham como resposta, para a denúncia e fuga, a institucionalização num lar de 3.ª idade, com a desculpa de que estas instituições oferecem a resposta necessária. É necessário apoio psicológico? Que se articule! É necessário apoio por parte da enfermagem? Que se articule! O que não podemos é encerrar estas pessoas num lar quando têm e querem a sua autonomia!
Estas mulheres foram filhas, irmãs, mães e avós! Sofreram anos até os verem as suas filhas e os seus filhos formarem a sua própria família. Depois, ajudaram as e os seus netos…agora…agora é o tempo de viverem a sua vida. Finalmente! Que sejamos uma sociedade preparada para lhes dar a resposta que não lhes demos durante uma vida de sofrimento.
Alexandra Manes
Deputada do BE na ALRAA