
O Bloco de Esquerda considera que a coligação de direita que vai integrar e suportar o próximo governo regional dos Açores começa da pior forma, com “falta de transparência, ao esconder dos açorianos e açorianas o conteúdo dos acordos assinados para garantir a indigitação do presidente do PSD pelo Representante da República”.
Para o Bloco de Esquerda é “insustentável” que a decisão do Representante da República de indigitar o presidente do PSD para formar governo “se mantenha alicerçada em acordos políticos de caráter secreto”.
No sentido de conhecer o conteúdo dos acordos firmados, o coordenador regional do BE/Açores, António Lima, enviou ontem, uma carta ao embaixador Pedro Catarino, divulgada nesse mesmo dia no Telejornal da RTP /Açores, onde afirma que “as circunstâncias exigem que o Sr. Representante da República divulgue o quanto antes os acordos políticos que tem em sua posse e que sustentaram a sua decisão de indigitar como presidente do Governo Regional o presidente do PSD”.
Na carta, António Lima diz que “a divulgação imediata dos acordos” que o Representante da República tem na sua posse “é um imperativo democrático e de transparência”.
Já hoje, Pedro Catarino respondeu à missiva do Bloco de Esquerda, também a divulgando publicamente (ver abaixo), onde afirma que não lhe cabe “substituir-se a esses partidos na decisão sobre se, quando, ou como” devem os acordos ser divulgados.
Para o Bloco de Esquerda há uma “incoerência entre o que afirmou o Representante da República na sua comunicação de indigitação do presidente do PSD para formar governo e as notícias que têm vindo a público sobre os acordos entre o PSD e partidos que suportam o Governo, o Chega e o Iniciativa Liberal”.
“Se, por um lado, o Representante da República garante que os acordos escritos que tem na sua posse ‘têm a duração da legislatura, e compreendem todos os pontos essenciais para a manutenção da estabilidade governativa’, ou seja, a aprovação do programa do governo, moções de censura, votos de confiança, bem como a aprovação do orçamento da região, por outro lado, há notícias que referem o contrário, ou seja, que a garantia da aprovação destes documentos em plenário não está incluída nos acordos”, diz o BE.
Para o Bloco de Esquerda, a “única forma de esclarecer esta situação e garantir transparência perante os açorianos e açorianas é a divulgação integral dos acordos assinados e que foram entregues ao Representante da República”. A propósito, o partido recorda, que em 2015, “os acordos de incidência parlamentar assinados entre BE, PCP, PEV e PS na Assembleia da República foram tornados públicos no próprio dia da assinatura, e antes da indigitação de António Costa para a formação de governo”.
REVELAR TEXTOS DOS PARTIDOS SERIA “INTROMISSÃO INACEITÁVEL”, RESPONDE PEDRO CATARINO
Em nota de imprensa hoje enviada à comunicação social, o representante da República torna pública a carta que endereçou ao coordenador regional do Bloco de Esquerda Açores, na qual sustenta ser uma “intromissão inaceitável” ser ele a divulgar os textos que os partidos que se juntaram para formar o próximo governo da região lhe levaram.
A decisão de tornar pública a missiva enviada ao BE, ao que parece, segundo nota do próprio gabinete do representante da República, deve-se ao facto de no “Telejornal do dia 9 de novembro da RTP-Açores, foi dada larga cobertura à carta que o Coordenador do Bloco de Esquerda – Açores, Dr. António Lima, dirigiu ao Representante da República, no mesmo dia”.
Transcreve-se abaixo e na íntegra, a carta hoje dirigida pelo representante da República, Pedro Catarino, ao coordenador do BE/Açores e deputado eleito para o parlamento regional, António Lima:
“Angra do Heroísmo, 10 de novembro de 2020
Exmo. Senhor Dr. António Lima
Coordenador Regional do Bloco de Esquerda / Açores
Permita-me, antes de mais, agradecer o modo construtivo como decorreu a nossa audiência e a clareza com que exprimiu as posições do Bloco de Esquerda.
Findas as audiências aos partidos, fiz um comunicado à imprensa porque entendi ser essencial explicar a todos os açorianos as razões em que se baseou a minha decisão de nomeação do novo Presidente do Governo Regional, num quadro eleitoral e parlamentar que suscita diferentes leituras.
Procurei apresentar essas razões com rigor factual e de forma objetiva, precisamente porque considero que o princípio da transparência é um valor imprescindível para uma vivência democrática saudável. Nesse sentido, tive o cuidado de sublinhar que os compromissos assumidos pelos partidos que formam ou apoiam a coligação são escritos, têm a duração da legislatura, e compreendem todos os pontos essenciais para a manutenção da estabilidade governativa.
Foram esses – e só esses – os pontos dos referidos compromissos que fundaram a minha decisão.
O princípio da transparência da vida política, contudo, não é absoluto. Em particular, não obriga a que as audiências com os partidos políticos sejam públicas ou a que o Representante da República tenha de revelar aos açorianos todo o seu conteúdo. Ora, como julgo resulta claro do meu comunicado, foi justamente nesse contexto – não propriamente de segredo, mas de alguma reserva – que os partidos me entregaram os respetivos acordos e compromissos escritos que tenho na minha posse.
Naturalmente, não tenho qualquer objeção a que os partidos políticos em questão os tornem públicos. Mas não cabe seguramente ao Representante da República substituir-se a esses partidos na decisão sobre se, quando ou como os devem levar ao conhecimento dos açorianos.
Tal constituiria, aliás, um condicionamento da estratégia política dos partidos em causa e uma intromissão inaceitável na luta partidária regional.
Tal como o Sr. Dr. António Lima fez, tornarei pública esta minha resposta.
Com os mais cordiais cumprimentos,
O Representante da República para a Região Autónoma dos Açores
Pedro Catarino”
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