
Em tempo normal, o Dia Mundial do Teatro que hoje se assinala, celebrava-se na Praia da Vitória com a exibição da peça “Autobiografia Autorizada” escrita e interpretada pelo conhecido ator, mas também autor brasileiro Paulo Betti, para quem o Teatro, mais do que o cinema ou a televisão é por excelência “o lugar do ator”, na sua humilde inquietude de quem o irá ver.
Criado em 1961 pelo Instituto Internacional do Teatro, assinala-se hoje, 27 de março, o Dia Mundial do Teatro.
Neste dia são várias as organizações culturais que organizam espetáculos teatrais destinados a promover esta arte milenar junto do grande público.
Na Praia da Vitória, o Auditório do Ramo Grande, em tempo normal, acolheria na noite de hoje, a peça “Autobiografia Autorizada” do ator e autor brasileiro Paulo Betti, lançada em 2015 e comemorativa dos seus 40 anos de carreira, integrada na digressão portuguesa iniciada no passado dia 10 de janeiro.
Porém, as vicissitudes destes tempos de pandemia com estado de emergência, compreensivelmente, interromperam a referida digressão e, por conseguinte, inviabilizaram a exibição da peça entre nós.
De todo o modo, em jeito de homenagem ao Teatro e a todos os seus agentes, apresentamos abaixo a entrevista realizada no dia 19 de fevereiro a Paulo Betti, onde perspetivávamos a exibição desta noite, muito longe de imaginarmos o tempo exceção que nos esperava.
Todos entendem muito bem a peça, acompanham e participam, rindo da mesma maneira que o público do Brasil ria.
Praia Expresso (PE) — “Autobiografia Autorizada” é uma peça escrita por si e estreada em 2015, ano da comemoração dos seus 40 anos de carreira. Ao que julgo saber, trata-se de um monólogo que conta o seu percurso de vida desde infância até ao ingresso na Escola de Arte Dramática. É — vamos simplificar — um testemunho pessoal e íntimo de uma história de superação, a de alguém que vindo do mundo rural alcança uma carreira de sucesso nacional e internacional. Que mais detalhes pode adiantar sobre a peça?
Paulo Betti (PB) — O que eu posso dizer é que a peça é uma comédia na maior parte do tempo. 50% do tempo é comédia, 25 % drama e 25% é poético. Então, eu posso dizer que é divertido…
Agora [19.02.2020] já estamos no meio da temporada, então eu posso dizer que o público embarca, viaja, e no final, se sente feliz e emocionado.
Às vezes eu tenho recebido o público no final do espetáculo para fotografias e “selfies”, e o que me deixa muito feliz é perceber que todos entendem muito bem a peça, acompanham e participam, rindo da mesma maneira que o publico do Brasil ria.

Eu sinto que o público se indentifica muito com a peça.
PE — A peça foi unanimemente aplaudida pela crítica brasileira, sendo nomeada para dois prêmios importantes. E a crítica portuguesa, como se tem portado?
PB — Até agora [19.02.2020] não tivemos crítica oficial num jornal, pelo menos que eu tenha conhecimento…
Eu sinto que o público se identifica muito com a peça. A minha preocupação inicial, antes de estrear aqui em Portugal era essa. Se esta história iria interessar, se iria manter a atenção do público. E o que eu noto é que tem mantido. Os testemunhos que eu recebo no final do espetáculo são muito positivos. Mas não creio ter acontecido uma critica oficial ainda de teatro, que se tenha dignado a escrever sobre a peça.

Essa peça tem como referência o livro do Eça de Queirós “A Cidade e as Serras”.
PE — A exibição aqui na Praia da Vitória corresponde ao fim da digressão portuguesa de “Autobiografia Autorizada”. Tendo passado por grandes palcos nacionais, que impressão leva do público português e da relação deste com o teatro?
PB — O que eu gostaria de dizer é que essa peça, está viajando com a produção da Casa da Língua Portuguesa, que tem como objetivo estreitar os laços entre Brasil e Portugal e que tem como objetivo também falar do Brasil profundo, do Brasil do homem do campo.
Essa peça tem como referência o livro do Eça de Queirós “A Cidade e as Serras” e também um livro que eu trouxe do Brasil e descobri lendo aqui em Portugal, um grande autor português chamado Miguel Torga, e estou encantado com esse escritor. Eu tive a oportunidade de visitar a casa dele, o centro de cultura que existe lá em Vila Real e que recomendo a todos a leitura de Miguel Torga e digo porquê. O Miguel Torga viveu no Brasil nos anos 20, 1920, durante 5 anos, dos 13 aos 18 anos, e como é esse o período da minha peça, mais ou menos a infância e entrada na juventude, eu acho interessante e me toucou muito conhecer a obra do Miguel Torga que é maravilhosa, e principalmente esse facto de ele ter vivido essa parte tão importante da vida no Brasil.

O Teatro é o lugar do ator, o cinema é o lugar do diretor, e a televisão é o lugar do patrocinador…
PE — Esta peça é exibida na Praia da Vitória precisamente no Dia Mundial do Teatro – 27 de março. O Paulo Betti já fez para além de teatro, cinema e televisão. Do ponto de vista do ator qual a representação mais exigente e porquê?
PB — O Teatro é o lugar do ator e é uma grande e feliz coincidência que a peça esteja sendo apresentada em Açores no Dia Mundial do Teatro. O Teatro é o lugar do ator, o cinema é o lugar do diretor, e a televisão é o lugar do patrocinador… para fazer uma brincadeira [risos]. Mas o Teatro é o lugar onde o ator afia o seu instrumento, onde ele é forçado a estar com pés no chão, a ter uma atitude humilde, porque sempre fica aquela questão — será que o público vai ao teatro me ver?

[Quem] no final do espetáculo for falar comigo, olho no olho, e disser que não gostou, eu devolvo o dinheiro.
PE — Se porventura alguém estiver indeciso quanto a ir ou não assistir à peça, quais os argumentos que apresentaria para o convencer a ir?
PB — Tem algumas pessoas que sentem uma certa rejeição inicial – ah eu vou assistir ou quê? uma pessoa contando a história da sua família ou contando a sua vida pessoal, a sua história de infância, isso não me interessa – bom, enfim, todas as histórias são baseadas nas histórias de vida da gente. O que eu posso dizer é que a peça fala da imigração italiana no Brasil, da imigração portuguesa no Brasil, da passagem do mundo rural para o mundo urbano e, também, que se a pessoa não gostar da peça e no final do espetáculo for falar comigo, olho no olho, e disser que não gostou, eu devolvo o dinheiro.

O público português responde muito bem e participa, é um público quente e isso é muito bom.
PE — Algo que considere importante referir e que não lhe foi perguntado?
PB — Eu tenho visto os teatros muito bem equipados, excelentes teatros, em todos os lugares por onde passei. Tenho lutado muito para que os camarins também sejam providos de um pequeno local para descanso dos atores e isso às vezes é esquecido, mas a maioria dos teatros têm. Um bom aparelho técnico. Todos os lugares por onde eu passei, eu achei que o público português responde muito bem e participa, é um público quente e isso é muito bom.
Fotos: © Mauro Cury | PE
